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Foto do escritorIzabel Vianna Villela, PhD, DABT

Novas Abordagens Metodológicas (NAMs)

Atualizado: 29 de out. de 2021

São considerados Novas Abordagens Metodológicas (NAMs antes referidos como Métodos Alternativos à Experimentação Animal) qualquer método, alteração de protocolo e conjunto de estratégias que reduza o número de animais, reduza a severidade do procedimento ou substitua o uso de animais de laboratório, de acordo com o Princípio dos 3 Rs. É normal o termo ser associado exclusivamente a métodos substitutivos, no entanto seu conceito é mais amplo.



O que é o Princípio dos 3 Rs?

Em 1959, o zoologista William M. Russel e o microbiologista Rex L. Burch apresentaram para a comunidade científica o livro The Principles of Humane Experimental Technique (“Os princípios da técnica experimental humana”), no qual propunham o princípio dos “Três Erres” na pesquisa científica: Redução, Refinamento e Substituição (em inglês, Reduction, Refinement, Replacement). Os pesquisadores definiam os 3 Rs como: Redução – a diminuição do número de animais utilizados e a reutilização de animais pela avaliação de diferentes “endpoints”; Refinamento – a busca e desenvolvimento tecnológico de métodos que minimizassem a incidência e a severidade de procedimentos científicos em animais; Substituição – emprego de organismos não-sensíveis, como bactérias, leveduras, estágios iniciais de desenvolvimento ou de células em cultura, substituindo os métodos “in vivo pelos in vitro”.


Além disso, as NAMs também têm o objetivo de melhorar a predição de efeitos tóxicos em humanos. Muitos ensaios que utilizam células e tecidos de origem humana apresentam resultados mais aproximados aos possíveis efeitos na população. Assim, eles presentam vantagens à versão clássica em animais e contribuindo para a assertividade da segurança do produto.


Quais ensaios/ abordagens são considerados NAMs?

Atualmente, vários ensaios in silico, in chemico, in vitro e ex vivo validados já são disponíveis para serem utilizados como métodos alternativos a métodos clássicos. É importante lembrar que métodos in vivo que focam na redução e/ou refinamento também são considerados métodos alternativos. No entanto, eles devem ser delineados de acordo com o objetivo do projeto e a aplicabilidade do método.


REGULAMENTAÇÃO DAS NOVAS ABORDAGENS METODOLÓGICAS (NAMs) NO BRASIL

- A Lei Arouca e a Criação do CONCEA

A publicação da Lei Arouca (11.794/2008) mudou a forma como a experimentação animal é tratada no Brasil. A lei aborda o uso de animais em atividades de ensino e pesquisa, regulamenta sua utilização, as condições de manutenção e de ensaio, visando fortemente o bem-estar dos animais.

O ponto fundamental da Lei Arouca foi a criação do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA), entidade de caráter democrático que conta com representantes de Instituições Científicas e de Sociedades Protetoras de Animais Legalmente Constituídas e que tem como principais competências:

– expedir e fazer cumprir normas relativas à utilização humanitária de animais com finalidade de ensino e pesquisa cientifica;

– credenciar instituições brasileiras para criação ou utilização de animais em ensino e pesquisa científica;

– monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas que substituam o uso de animais em ensino e pesquisa.

Com foco nesta última competência, o CONCEA designou uma câmara permanente dedicada aos métodos alternativos.


Resolução Normativa 18 – CONCEA

Em setembro de 2014, o CONCEA emitiu a Resolução Normativa 18 (RN 18), aprovando pela primeira vez métodos que considerou como alternativas à versão original do método. Esta resolução aprovou 17 métodos incluindo alternativas para sete desfechos toxicológicos (desfecho toxicológico: resultado ou efeito monitorado por um estudo toxicológico).

Os desfechos toxicológicos cobertos pela RN 18 são:

I – Potencial de irritação e corrosão da pele

II – Potencial de irritação e corrosão ocular

III – Potencial de Fototoxicidade

IV – Absorção cutânea

V – Potencial de sensibilização cutânea

VI – Toxicidade aguda

VII – Genotoxicidade


- RDC N. 35/2015 – ANVISA

A RN 18 estabeleceu o prazo de cinco anos para que os 17 métodos fossem considerados prioritários às versões tradicionais. Este prazo tornou-se mais crítico após a publicação pela ANVISA da RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA (RDC) N° 35/2015, que dispõe sobre a aceitação dos métodos alternativos à experimentação animal recomendados pelo CONCEA. Este ato deu peso regulatório aos métodos aprovados pelo CONCEA, ou seja, não se trata apenas da aceitação pelo conselho, mas da aceitação deste órgão regulador impactando todo o setor produtivo regulado pela ANVISA.


- SETEMBRO 2019 – CINCO ANOS DA RN 18

Em setembro de 2019, a RN 18 completou cinco anos de publicação pelo CONCEA. Com isso, sempre que forem necessários experimentos com objetivo de abordar algum dos desfechos toxicológicos previstos na RN 18, o método alternativo deve ser o primeiro método de escolha, para todas as atividades de pesquisa básica ou aplicada no Brasil, do projeto científico à prestação de serviço com fim regulatório.

Em agosto de 2016, o CONCEA emitiu a Resolução Normativa 31 (RN 31), que aprovou mais sete métodos, contemplando além dos desfechos de Potencial de irritação e corrosão ocular e dérmica, já incluídos na RN18, os desfechos Avaliação da Toxicidade Reprodutiva e Avaliação da contaminação pirogênica em produtos injetáveis. Estes sete métodos passarão a ser obrigatórios em agosto de 2021. Em 2019 ocorreu a aprovação de mais um método para avaliação de pirogênio em produtos injetáveis.


Então, o uso do método alternativo passa a ser obrigatório?

Não exatamente. Ele é o método prioritário de escolha. Mas se existir alguma justificativa científica que sustente que ele não é adequado para a amostra a ser testada ou que ele não responde todas as questões que precisam ser respondidas, é possível a realização de outra versão do ensaio. Por exemplo: questões referentes à solubilidade da amostra podem ser impeditivas para a realização de ensaios in vitro, ou o método alternativo não é aplicável para a conclusão de algumas classificações toxicológicas. De maneira geral, acredita-se que apenas uma fração pequena dos casos será enquadrada nessas justificativas.


Não está claro como será feito este controle, mas parece lógico que o primeiro filtro ocorra dentro das Comissões de Ética ao Uso de Animais (CEUA). Cada instituição que realiza experimentação animal no Brasil deve ter uma CEUA devidamente registrada no CONCEA. Possivelmente, as comissões de ética não aprovarão a realização dos métodos tradicionais sem uma boa justificativa do porquê o método alternativo não é adequado. Um segundo filtro pode ocorrer na agência reguladora, que pode abrir questionamentos ou barrar dossiês que não obedeçam às regulamentações.




BOAS PRÁTICAS DE LABORATÓRIO (BPL) E NOVAS ABORDAGENS METODOLÓGICAS (NAMs)

Boas Práticas de Laboratório (BPL) é um sistema de qualidade que abrange o processo organizacional e as condições nas quais estudos não-clínicos de segurança à saúde e ao meio ambiente são planejados, desenvolvidos, monitorados, registrados, arquivados e relatados. Estes princípios são aplicados a todos os estudos de segurança ambiental e de saúde exigidos pelos órgãos regulamentadores, visando o registro ou licença para produtos farmacêuticos, agrotóxicos, cosméticos, medicamentos veterinários, aditivos de alimentos, aditivos de rações e produtos químicos industriais, a não ser que sejam dispensados por legislação.

Como qualquer outro ensaio de avaliação de segurança de produtos, os métodos alternativos também podem e, em alguns casos, devem ser realizados em condições de BPL. A BPL garante a qualidade e a rastreabilidade dos dados trazendo robustez e confiabilidade nos estudos.


Existem Métodos Alternativos em BPL no Brasil?

Dos 17 métodos aprovados pelo CONCEA, a maioria está disponível no Brasil, já temos todos os desfechos toxicológicos contemplados, e são realizados de acordo com as Boas Práticas de Laboratório (BPL).


O QUE VEM POR AÍ?

No exterior, vários métodos estão em desenvolvimento para serem utilizados como métodos alternativos para estudos de screening ou registro de produtos, os quais empregam diferentes tecnologias. Outros já foram validados, possuindo guias reconhecidos como os publicados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Além disso, muitas iniciativas estão sendo tomadas pelos governos dos Estados Unidos e Comunidade Europeia para o fomento de desenvolvimento e aceitação de métodos alternativos.

No Brasil, após a publicação da RN 18 pelo CONCEA, houve uma grande evolução em todas as questões referentes aos Métodos Alternativos. Somos referência na América do Sul, nossa legislação e ciência despontam no continente. Neste caminho, o CONCEA já aprovou mais métodos alternativos, e diversas iniciativas para disseminação e implementação de alternativas vêm sendo realizadas.

Entretanto, é fundamental que o governo, a indústria e a academia unam esforços para a promoção do conhecimento sobre os métodos alternativos e para a disponibilização de ensaios no Brasil. Isto engloba desde o fomento de cursos e treinamentos e atualização de legislações até o incentivo de implementação e contratação de ensaios.

Temos um longo caminho a trilhar! Vamos em frente!


Izabel Villela

Diretora Executiva da InnVitro

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